06 maio, 2009

DISTÂNCIAS

o velho vem pela cidade traz os olhos muito longínquos
viu outras paragens ouviu os bardos dos naufrágios
sei porque guarda na mão uma sombra de barcos e corais
há luz nos seus olhos limpos protectores
cantam neles os duendes das crianças histórias que ninguém quer ouvir
o velho vê o sol e sabe apontar estrelas no firmamento
vê por entre arranha-céus gosta de murmurar
dizem que é velho que não se abeirou de um deus
ou disse uma palavra menos própria
não estalou os dedos à sorte não se queixou de passos dados
no seu murmúrio de nómada ou de criança muito antiga
mas eu sei que o velho ria como sei dos deuses que inventamos
nos socorremos vertemos a lágrima nas despedidas nos amparamos
procuramos um sabor de heresia uma prata muito líquida no fio dos olhos
quando paramos e sabemos quanto mundo do mundo somos e distamos

José Ribeiro Marto