21 janeiro, 2010

estamos sós com aquilo que amamos




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.................................................................................... -ao Augusto Mota


é o vigésimo segundo dia do mês de Janeiro
”esse ponto exacto à volta do qual tudo oscila
testemunha do balanço entre a noite de um inverno exterior e
a aurora de uma primavera interior”
é vigésimo segundo dia do mês de Janeiro
o rito
a celebração da arte na Arte
sabemo.nos presos a um corpo
à matéria e
recusamos aceitar ser esse o local da nossa morte
um corpo nada mais é do que um fim que
se elabora num erro
só podemos aspirar aos objectos que
tenham o estatuto de pensamento mas
também neste caso
os objectos tornam.se insuportáveis
na medida em que o corpo
como objecto criador do pensamento
também é insuportável
é esta deficiência técnica que
para os cépticos como eu
faz surgir a estranheza e o medo da morte
tudo isto é um erro
primeiro por
que na dicotomia objecto /corpo
objecto/pensamento
há uma verdade insofismável
cada um ao nascer transporta em si um cadáver
segundo por
que há que aprender os limites da ideia
há que saber os limites da linguagem
há que saber ser nos limites
da linguagem e da matéria
calcular a distância
entre a matéria e o pensamento
entre a nossa vontade perceptiva e
o estado real do objecto por
que a mesma pode resultar da fuga do objecto
este deixa de ser para querer ser
os objectos podem deixar de existir
para existir a esperança do objecto que
especifica a fuga e a ausência e
esta é a forma de consciencializar uma afeição mas
a falta do objecto nunca nos faz aproximar dele por
que o que amamos é a ausência
a deslocação
a esperança do objecto
”estamos sós com aquilo que amamos”
-escreveu Friedrich Novalis
julgo imperioso cultivar o espaço bruto se
quisermos escrever o poema
deambulamos num espaço vazio que
fica entre corpos e ideias
nomes e/ou objectos
como preencher esse vazio?

um Poeta
sobe as montanhas da Palavra e aí
entre o dia e a noite
julga.se um fugitivo
sem saber que nunca sai do mesmo lugar
deseja ser um grito e ter asas de ouro
mergulha a fronte suave nas mãos geladas e
deixa o corpo cair
sonha
procura na terra negra uma flor azul
sabe da escuridão e do frio que
enchem o vazio e
então só
então
cumpre.se na Ausência


-cesare dandini

gabriela rocha martins