28 dezembro, 2008

Africana

Foste a madrugada inocente,
A espera verde
Onde o fogo do teu Sol descera
Para beijar-te.

Foste a pureza da selva,
A seiva que regou a terra dos imbondeiros,
Onde a luz irradiou, feliz, do teu bronze,
Ao encontro das coisas que te amavam
Com seu olhar.
E dançavas, livre como teus seios,
Ao som do batuque.
E sonhavas sem ser preciso sonhar!

Mas, um dia, eles chegaram...
E te fizeram escrava.
Violaram-te
E venderam o teu corpo, amarrado,
Como coisa de mercado.
Mataram os teus amores,
E os teus beijos secaram.

Depois engravidaste
Com a dor da tua raça,
E o sémen que recebeste
Deu-te a alma que geraste.
Ninguém a pode comprar!
Ninguém a pode vender!

Mas é preciso sonhar...
Tens de aprender, outra vez,
Porque agora é preciso!
Mesmo que seja a lutar
De flecha, fuzil ou canhão.
E um dia amanhecerás,
De novo,
Com teu Povo,
Com teu Povo pela mão!

*
fotografias de arquivo da guerra colonial (nambuang)
poema de Sérgio O. Sá, in VERSOS NA GUERRA - VERSOS DE PAZ, 1971.