12 dezembro, 2008

Nas Vagas do Tempo

agradeço à Gi dos Pequenos Nadas
Suspensa dos pêndulos do tempo, vivo à velocidade
dos relâmpagos, flor alucinada, pousada entre os ventos.
Nas metamorfoses do silêncio, nas nervuras do céu,
penetro e habito, nos nervos do sílex pernoito,
nas giestas habito, nas flores amarelas,
nas ramagens aéreas, é que o meu cérebro se espraia
e o meu corpo refulge, se estende e dormita.

Trepanando a tépida imensidão, a urgência do sol circula,
em ondas verdes, em ondas brancas,
em substâncias fendidas, em areias esquecidas,
em palmeiras lunares, descobertas em paraísos distantes.

Entre os desertos e os oásis, o destino da água desenha,
nos remos de neblina, o lugar onde as palavras constroem
de novo a espiral de bruma, a chama, a sede,
o azul e os violinos.
Na salsugem marinha, no leito dos rios, nos limos,
nos cardos, habita o fogo, a ruína, a transparência.
No imenso ardor que guarda a febre e os murmúrios,
a vertigem de espuma desperta, nos casulos do nada,
a carícia exacta que flutuou, um dia,

no selo luminoso das vagas do tempo.

Maria do Sameiro Barroso,
in Revista Saudade, nº 10, Junho, Amarante, 2008, p. 45