06 março, 2008

Eduardo Pitta...

...nasceu a 9 de Agosto de 1949. É poeta, ficcionista, ensaísta e crítico literário do Público. Colabora desde 1967 em publicações literárias de vária índole. A partir de 1974 publicou oito livros de poesia, uma colectânea de contos, um romance, quatro volumes de ensaio e um diário. Entre 1994 e 2005 manteve na revista LER uma coluna de crítica de poesia. Em 2002 organizou para a revista francesa Arsenal um dossiê sobre literatura portuguesa actual. Tem participado em seminários, colóquios e festivais de poesia, em Portugal e no estrangeiro, e efectuado conferências sobre poetas. Escreve todos os dias no blogue Da Literatura [http://www.daliteratura.blogspot.com]. Tudo sobre o autor em www.eduardopitta.com

OBRA

POESIA: Sílaba a Sílaba, 1974, Um Cão de Angústia Progride, 1979, A Linguagem da Desordem, 1983, Olhos Calcinados, 1984, Archote Glaciar, 1988, Arbítrio, 1991, Marcas de Água, 1999, Poesia Escolhida, 2004. FICÇÃO: Persona, 2000 [contos, ed. rev. 2007], Cidade Proibida, 2007 [romance]. ENSAIO: Comenda de Fogo, 2002, Fractura, 2003, Metal Fundente, 2004, Intriga em Família, 2007. DIÁRIO: Os Dias de Veneza, 2005.. A PUBLICAR: Língua dos Eleitos [ensaio].
autor do blogue Da Literatura [clique]
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1


Um cão de angústia progride
na cidadela sitiada

enquanto te demoras
no sorvo
no arquejo largo
no topo da saliva

enquanto te entreabro
as pernas altas
enquanto te humedeço
o musgo tenro

para te ferir com a boca
cheia de vidro moído.


Um Cão de Angústia Progride, 1979


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2


Essa gente não sabe dos corpos a linguagem da desordem.
Esboça, quando muito, pequenos gestos
periféricos.
É uma longa aprendizagem
que pouco lhes diz. Pervertem-se na ignorância
de tudo e de si mesmos e vão (sobre)vivendo com a lentidão
e o sensabor de quem de tudo desistiu.
Subsistem.
A praia que lhes sobra chega para a dessatisfação
do largo mundo.
Percurso rastreado dia a dia onde não cabem
os Melquíades da infância.

Neles, a contiguidade do desejo é vital e extemporânea: um
[vinho
resinoso e a polpa de algumas azeitonas
configuram
padrões de vida não vivida.
Assumem-se, outrossim, como a geração do martini.
Progridem de snack para snack ao sabor de liofilizadas
cerejas, outros fumos, vários palpites
gustativos.
Entre a magia do sound
e a inutilidade de alguns lances
vão auscultando um tempo de procura e
merecimento.


A Linguagem da Desordem, 1983