22 julho, 2008

TEJO

À memória de Ruy Belo


..............................Aqui ainda é o Tejo dos salgueiros
..............................um rio manso sem navios nem gaivotas à ré
..............................aqui o Tejo é de avieiros
..............................mar de fingir a serenidade as fúrias da maré

..............................Aqui o Tejo é uma estrada de peixes soterrados
..............................um ignoto rio romântico e louco entrando pelas casas
..............................com cabelos ardidos sob um leito de estios
..............................e ilhas de suor que se escondem na bruma
..............................onde os pássaros inscrevem a rota dos naufrágios

..............................Aqui o Tejo não sabe a fala do mar nem de outros rios
..............................é apenas um rio ágil e vago que vai soturnamente
..............................desbravando os limites de ser espelho de margens
..............................estorninho perdido nas monções do vento
..............................um mapa desenhado com marés de lágrimas

..............................rio bilingue aberto à desmesura das palavras ocultas
..............................à construção do sonho
..............................do porto onde o corpo encontre leito
..............................para estender a sombra
..............................e a interminável ilusão do sangue triunfal
puro prazer das línguas misturadas

DOMINGOS LOBO



fotografia "A Luz No Rio Tejo".